A decisão do ministro Edson Fachin de anular as condenações do ex-presidente Lula em Curitiba pegou todos de surpresa nesta tarde. Fachin reconheceu algo que o procurador Deltan Dallagnol sabia desde 2016 e que nós revelamos em 2019: Curitiba não era vara competente para o processo do triplex, já que essa vara só julgava denúncias relacionadas à Petrobras. Só o fato de esse processo estar sendo tocado no Paraná constitui uma fraude processual evidente.

O trecho acima é de uma das primeiras matérias na série Vaza Jato, divulgados pelo The Intercept. Ao longo dos últimos dois anos, foram divulgadas mais de 100 reportagens mostrando a submissão da Procuradoria Federal ao ex-juiz Sergio Moro, a indicação de provas por parte do juiz, o conluio entre procuradores e magistrado, o comprometimento da autonomia da Polícia Federal, o absoluto desrespeito à Procuradoria Geral da República e ao Supremo Tribunal Federal. As ilegalidades nos processos contra Lula são parte disso, mas os desmandos da Lava Jato e suas consequências políticas vão muito além. 

Por quase cinco anos, a força-tarefa de Curitiba navegou sob a tutela de Sergio Moro com o apoio de uma imprensa dócil, instituições de controle omissas e políticos acovardados. 

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A Verdade só veio à tona após a ação da imprensa independente e sem interferências de políticos. Mesmo assim, a ação dos Hackers que trouxeram as conversas à luz da verdade, foram tratadas como crimes e não como a busca da verdade. Por muitos anos, as provas foram ignoradas e até desqualificadas, até que seus protagonistas tornaram-se coadjuvantes do processo político e perderam o espaço às manchetes de jornais.

O Fato do ex presidente estar elegível neste momento, não quer dizer necessariamente que ele o esteja até outubro de 2022. 

Caso a decisão de Fachin seja mantida, Lula teria que novamente passar por condenações em primeira e segunda instâncias, com esgotamento dos recursos disponíveis, para ser impedido de disputar as próximas eleições presidenciais. Tudo isso em cerca de 1 ano e 7 meses, com muitas etapas do processo tendo que ser refeitas.

Decisão pode Favorecer Bolsonaro

A Medida pode ter consequências positivas para Bolsonaro, já que favorece uma polarização com Lula e pode atrapalhar os planos de viabilização de uma candidatura competitiva de “centro”, reduzindo o espaço a ser ocupado por nomes como de João Doria (PSDB) e Eduardo Leite (PSDB), de Luciano Huck ou de Luiz Henrique Mandetta (DEM).

Em um contexto onde o combate à corrupção dá lugar as preocupações com emprego e saúde, o cenário pode ser favorável a Lula e ao PT. 

Isto pode ser positivo para o país, uma vez que o crescimento do nome de Lula na corrida eleitoral deverá levar Bolsonaro a uma freada em sua política egocêntrica populista. Pode ainda inviabilizar os planos da equipe econômica de aumentar a carga tributária em busca de dinheiro para concessão de auxilio emergencial.

Com a decisão de Fachin, os casos de Lula voltam à primeira instância, agora na Justiça Federal do Distrito Federal. No meio jurídico há dúvidas sobre o momento em que os processos serão retomados, já que Fachin não afastou provas produzidas. Em tese, uma nova denúncia teria que ser apresentada pelo Ministério Público local – que substitui a força-tarefa de Curitiba como parte acusatória.

Mas as movimentações podem suscitar novos questionamentos dos advogados de Lula, que deverão contestar qualquer ato que tenha a digital do ex-juiz Sergio Moro. Com o MPF apresentando de novo a denúncia, haverá um novo debate sobre a instrução do processo e o que é aproveitável ou não do processo que ocorreu em Curitiba.

Um processo penal anulado é como uma camisa que você abotoa errado. Se errou uma casa do botão, não adianta consertar, é preciso voltar até o momento em que ocorreu o erro para continuar. Então, ele volta à estaca zero.